ARTIGO - Responsabilidade por dano ambiental – O caso de Brumadinho e os crimes da Vale
Informações
para os ativistas – direito ambiental referente ao caso.
Por Letícia Filpi 30.01.2019
Importante lembrar que
há crimes em outras esferas, como improbidade administrativa ou homicídios culposos, por exemplo. O que
veremos aqui é só a questão ambiental.
1.PRINCÍPIOS:
PRINCIPIO DO POLUIDOR
PAGADOR
Este princípio é uma
das bases do direito ambiental, o poluidor é todo aquele que destrói o meio
ambiente, seja pessoa física, jurídica, de direito publico ou de direito
privado.
PRINCIPIO DA PRECAUCÃO
/PREVENÇAO
Esses princípios, que
também formam a base de sustentação do direito ambiental, determinam que toda
atividade humana deve preservar a segurança ambiental, pois o dano ao meio
ambiente tem consequências sérias e imprevisíveis, de modo que a politica
nacional de meio ambiente instituiu regras como o licenciamento ambiental, que
são estudos profundos dos impactos das atividade e sua adequação à realidade
ambiental local. O empreendimento só poderá acontecer se os requisitos dos
estudos (chamados EIA/RIMA) estiverem de devidamente preenchidos. No caso de
Brumadinho, as licenças foram unificadas em uma só, em desacordo com as normas,
como consequência, os estudos são superficiais, inadequados e insuficientes.
Além disso, não houve fiscalização e as
obras foram feitas sem nenhum cuidado.
Desse modo, o Estado de
Minas Gerais, na pessoa do então governador Fernando Pimentel, do atual
governador Romeu Zema Neto, bem como os agentes públicos Germano Luiz Gomes
Vieira, Secretário Estadual do Meio Ambiente e Breno Esteves Lasmar, Presidente
da Câmara de Atividades Minerárias do Estado de Minas Gerais, o então prefeito
da época e o atual, bem como todos os agentes públicos municipais de Brumadinho,
os agentes federais do IBAMA e do ICMBio são corresponsáveis, juntamente com o
dirigentes da empresa Vale, pelos crimes ambientais ocorridos na cidade de
Brumadinho/MG.
2. DO DIREITO
A Declaração do Rio de
Janeiro de 1992 prevê, em seu o Princípio 13, que os Estados deverão atuar
de maneira rápida para a responsabilização
e indenização por efeitos oriundos dos danos ambientais, causados por
atividades realizadas dentro de sua jurisdição, ou seu controle, em zonas fora
de sua jurisdição.
A Constituição
Federal, em seu artigo 225, parágrafo
3º estabelece que
“as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados.”
Vejamos que a CF determina que a responsabilização se dará em
3 esferas concomitantes: Civil, administrativa e penal.
O mesmo artigo, em seu parágrafo 2º,
determina que aquele que
“explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei”.
Assim, nasce para os infratores das normas ambientais, a
chamada responsabilidade OBJETIVA, ou seja a responsabilidade na qual não
importa se o causador do dano agiu com intenção ou negligência. Havendo o dano e a relação deste com a
conduta, nasce a obrigação de restaurar a natureza ou indenizar as vítimas.
Essa responsabilidade sem
culpa é prevista em leis do ordenamento infraconstitucional, como a Lei
de Crimes ambientais (9.605/98), Lei de Biossegurança, a Lei de Recursos Sólidos
e o Novo Código Florestal.
3. JURISPRUDÊNCIA
Nas decisões dos juízes, temos que o Poder Judiciário segue
essa linha de pensamento, assim, o STJ
decidiu nos seguintes termos:
“Para
fins do art. 543-C do Código de Processo Civil:
a) a
responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco
integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o
risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa
responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para
afastar sua obrigação de indenizar;
*nexo causal = relação do dano ambiental com a conduta do
infrator.
b) em
decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais
causados e
c) na
fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja
feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível
socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz
pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade,
valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às
peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento
sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação
pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado.
STJ, 2ª S., REsp 1374284/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 27/08/2014,
DJe 05/09/2014.
Em julgados mais recentes, o STJ confirmou que a responsabilidade civil por danos
ambientais é objetiva e solidária, de todos os agentes que obtiveram
proveito da atividade que resultou no dano ambiental:
“não com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, mas
pela aplicação da teoria do risco integral ao poluidor/pagador prevista pela
legislação ambiental (art. 14, § 1º, da Lei n.6.938/81), combinado com o art.
942 do Código Civil”
( STJ, 2ª T.,
AgInt no AREsp 277.167/MG, Rel. Min. Og Fernandes, j. 14/03/2017, DJe 20/03/2017)
4. RESPONSABILIDADE
ADMINISTRATIVA
A
responsabilidade administrativa decorre da infração de normas publicadas pela
Administração Pública, como, por exemplo, as normas locais que regulam o
funcionamento dos municípios, normas técnicas especificas de alguma atividade
profissional, etc. Essas regras fundamentam-se no poder de polícia, que é
prerrogativa do Poder Público.
O artigo 70 da Lei 9.605/1998 define
a infração administrativa ambiental como
“toda ação ou
omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e
recuperação do meio ambiente.”
As penas, de acordo com o artigo 72 da referida lei, são:
advertência; multa simples; multa diária;(...) embargo de
obra ou atividade; demolição de obra; suspensão parcial ou total de atividade;
e restritiva de direitos
5.RESPONSABILIDADE
CIVIL
A
responsabilidade civil está expressa no final do artigo 225, parágrafo 3º da CF, trazendo a obrigação de reparar os danos
causados. Vale transcrever o artigo completo para conferência:
Art. 225. Todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
*(impondo-se ao poder publico e à coletividade = todos nós
somos responsáveis pela proteção da natureza e dos animais)
I - preservar e
restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das
espécies e ecossistemas;
III - definir, em todas
as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente
através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos
atributos que justifiquem sua proteção; -
*A usina de Brumadinho estava em área de
proteção ambiental chamada de zona de amortecimento (espaços no entorno de
unidades de conservação, para que a biodiversidade não sofra com as atividades
humanas, são como muros de proteção das unidades, e o governo de Minas Gerais
não respeitou esse espaço ao permitir que a Vale exercesse atividade de alto
impacto dentro as zona de amortecimento)
IV - exigir, na forma da
lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental,
a que se dará publicidade;
V - controlar a
produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que
comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI - promover a educação
ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a
preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a
flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§ 2º Aquele que explorar
recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de
acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da
lei.
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados.
(...)
Seguindo os mandamentos constitucionais, o artigo 14, parágrafo 1º da Lei da Política
Nacional do Meio Ambiente – Lei n. 6.938/81 estabelece que:
“sem obstar a aplicação das
penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente
e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos
Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e
criminal, por danos causados ao meio ambiente.”
Como já mencionado, a responsabilidade pelo dano ambiental é
objetiva, sendo desnecessária a comprovação do dolo o culpa para caracterização
da obrigação de pagar e/ou compor os danos, bastando existir o dano e o nexo
causal.
Assim, TUDO O QUE FOI
DESTRUIDO PELA LAMA – RIO, FLORESTAS, ROÇAS, MATAS, CASAS, AUTOMOVEIS,
ETC. DEVE SER RECUPERADO OU INDENIZADO
PELA VALE E PELO ESTADO. ESSA INDENIZAÇÃO É POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
É irrelevante se a
atividade causadora do dano é ou não lícita e se está ou não de acordo com as
normas ambientais. Ainda deve-se mencionar que não são excludentes de
responsabilidade pelo dano ambiental o caso fortuito e a força maior.
PARA A RESPONSABILIZAÇÃO PELO DANO AMBIENTAL, NÃO SE
QUESTIONA , SEQUER, SE A VALE FOI
NEGLIGENTE. OCORREU O DANO, ELA PAGA.
OCORREU O DANO E O NEXO CAUSAL, ENTÃO NASCEU A
RESPONSABILIDADE DE RECOMPOR E/OU INDENIZAR AS VITIMAS MATERIAL E MORALMENTE.
- Também, não excluem a obrigação de pagar:
a) a existência de licenciamento ambiental regular e a observância de
seus requisitos. Ainda que a Vale tivesse seguido à risca todas as normas
ambientais, sua atividade é de risco e, ocorrendo qualquer acidente, ela será
responsabilizada.
b) a degradação preexistente ou a existência de área já ocupada por
humanos. Mesmo que a área estivesse degradada pela ocupação humana, atividade
da Vale pe alto risco, então a responsabilidade existe.
c) a colocação de placas no local avisando a presença de materiais perigoso
e outros avisos
d) fato da natureza , como deslizamentos de terras, chuvas e outros
fenômenos naturais
f) a omissão do Estado na fiscalização – essa omissão responsabiliza,
inclusive o próprio Estado, que não agiu para impedir a tragédia.
6. RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL
QUANTO A TODOS OS ANIMAIS:
RESPONSABILIDADE PENAL POR MAUS TRATOS E MORTE. CRIME
AMBIENTAL PREVISTO NO ARTIGO 32 DA LEI. PARA CADA ANIMAL MORTO, UM CRIME DIFERENTE –
AS PENAS SE SOMAM.
QUANTO A TODO O MEIO AMBIENTE: CRIME AMBIENTAL DE POLUIÇÃO.
Lei 9.605/98:
Em
seu artigo 2º, a lei estabelece punição para a ação e omissão em relação ao
dano ambiental.
Art. 2º “Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos
nesta lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade,
bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão
técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica,
que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir sua prática,
quando podia agir para evitá-la.”
RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA - TODOS OS PARTICIPANTES SÃO RESPONSABILIZADOS PELO CRIME, NA MEDIDA DE
SUA PARTICIPAÇÃO NAS CONDUTAS, INCLUSIVE AQUELE QUE, TENDO PODER PARA ISSO, NÃO
IMPEDIU – AGENTES PUBLICOS RESPONSÁVEIS,
FISCAIS, MEMBROS DO PODER EXECUTIVO, ETC.
Em Brumadinho, são
responsáveis, desde os funcionários, engenheiros, gerentes, diretores até os
auditores, prefeito, membros dos órgãos ambientais locais, estaduais e
federais, enfim todos que concorreram para a prática e todos aqueles que,
podendo impedir o dano, não agiram nesse sentido. Inclusive os promotores de
justiça locais, que são os advogados da sociedade e têm, como dever
constitucional, proteger os direitos difusos e coletivos.
ALÉM DAS PESSOAS, A
PRÓPRIA EMPRESA PODE SER RESPONSABILIZADA PELOS CRIMES DA LEI 9.605/98:
O artigo 3º estabelece que
“As
pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente
conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por
decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no
interesse ou benefício da sua entidade.”
Requisitos
para a responsabilização penal DA EMPRESA:
- que a infração ambiental tenha
sido originada de decisão de seu representante e
- que tenha por motivação
beneficiá-la.
Em Brumadinho, ocorreram essas
duas hipóteses, então a VALE, COMO EMPRESA, TAMBÉM RESPONDE PELOS CRIMES.
As sanções penais ambientais
compreendem as penas privativas de liberdade, restritivas de direito e multa.
As penas privativas de liberdade compreendem a reclusão e a detenção, para os
crimes, e a prisão simples, para as contravenções.
7. DOS ATOS CRIMINOSOS DA VALE E
DO ESTADO DE MINAS GERAIS
A
Lei nº 9.985 (SNUC), de 18/07/2000,
que regulamenta o art. 225, § 1o , incisos I, II, III e VII da Constituição
Federal, instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e
deu outras providências.
No
artigo 2o . inciso XVIII, definiu zona de amortecimento como
“o entorno de uma unidade de conservação, onde
as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o
propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade”.
As
Operações da Mina da Jangada e Córrego do Feijão da Vale/MBR estão inseridas na
Zona de Amortecimento de um Parque Estadual evidenciando o risco direto aos
recursos hídricos da região.
O
Governo do Estado sabia do risco de rompimento da barragem do Córrego do
Feijão. A Câmara de Atividades Minerárias do Estado de Minas Gerais também
estava ciente e, mesmo assim, aprovou 44 dias antes da tragédia a operação das
atividades da Vale na região.
Governo
de Minas, de forma totalmente irresponsável, alterou a classe do complexo
minerário de classe 6 (grande potencial) para 4 (médio potencial degradador),
com a conivência do Município e de todos os órgãos públicos responsáveis pela
preservação ambiental, inclusive, sem resistência por parte do Ministério
Publico.
O processo de licenciamento, que normalmente, é
dividido em três fases, foi feito de uma só vez. Isso implicou em estudos
malfeitos e insuficientes a respeito dos riscos e das precauções a serem
tomadas. Englobaram em um único processo
a Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação, ou seja, a Vale
de uma só vez, saiu com todas as
licenças prontas, iniciando a operação imediatamente. Significa que: AS
ATIVIDADES DA VALE, DE ALTA PERICULOSIDADE PARA A VIDA DE BRUMADINHO, FORAM
INICIADAS SEM QUE OS DIRIGENTES DA EMPRESA TIVESSEM A MINIMA IDEIA DOS RISCOS E
DE COMO EVITÁ-LOS.
Importante
lembrar novamente que as atividades da mineradora foram instaladas na zona de amortecimento do Rola Moça, em área
considerada de importância biológica especial!! Os órgãos ambientais do Estado de Minas
Gerais ,sob o comando do e Secretário Estadual do Meio Ambiente, responsáveis fiscalização
e monitoramento de barragens de rejeitos minerários foram, coniventes com os
crimes cometidos pela mineradora Vale. São, portanto, juntamente com os
dirigentes da empresa, responsáveis diretamente e indiretamente, por centenas de
mortes.
E
o argumento da Administração e dos empreendedores é que a atividade minerária
gera milhares de empregos e arrecada bilhões de reais para o erário. Pensando
apenas no dinheiro, se esqueceram que, acima da ganância, deve existir o respeito
à vida, à ética e à moral.
Assim,
ELES COMETEM MAIS CRIMES, ALÉM DA CORRUPÇÃO E IRRESPONSABILIDADE NA INSTALAÇÃO
DA USINA:
A
MATANÇA DE ANIMAIS EM SITUAÇÃO DE AGONIA.
FORAM
COLOCADOS EM AÇÃO HELICOPTEROS COM AGENTES PÚBLICOS PARA MATAR A TIROS ANIMAIS
QUE PRECISAM DE AUXILIO.
ATIVISTAS
FORAM IMPEDIDOS DE ENTRAR PARA REALIZAR OS RESGATES.
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